Bárbara nasceu Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira, em São
João Del Rei, Minas Gerais, em 1759. Primeira poetisa brasileira,
culta e revolucionária, Bárbara foi uma mulher que, em toda sua
vida, agiu com coragem e fibra, Aos 20 anos se apaixonou pelo poeta
Alvarenga Peixoto. Da paixão, nasceu Maria Ifigênia.
O casamento só aconteceu depois do nascimento da menina e Bárbara
manteve o nome de solteira. A ligação entre os dois foi marcada pela
harmonia e companheirismo. O casal teria, ainda, outros três filhos.
Bárbara e Alvarenga Peixoto participaram da organização da
inconfidência do país.
Segundo Aureliano Leite, no livro "A Vida Heróica de Barbara
Heliodora", a presença de Bárbara foi fundamental na vida de
Alvarenga Peixoto:"...Ela foi a estrela do norte que soube guiar a
vida do marido, foi ela que lhe acalento o seu sonho da
inconfidência do Brasil…quando ele, em certo instante, quis
fraquejar, foi Bárbara quem o fez reaprumar-se na aventura
patriótica. Disso e do mais que ela sofreu com alta dignidade fez
com que a posteridade lhe desse tratamento de Harmonia da
Inconfidência’’.
O casamento durou 10 anos, período da produção poética de Eliodora.
Em 1789, época da Conjugação, Alvarenga Peixoto foi preso e
arrastado de São João Del Rei ao Rio de Janeiro, sendo levado para a
fortaleza da Ilhas das Cobras e, depois, ele seria mandado para
África, onde morreria.
Suas lutas e conquistas nos surpreendem mesmo atualmente, mas
ocorreram há 250 anos, época marcante do preconceito e violência
contra as mulheres.
No cárcere, Alvarenga
Peixoto escreveu
"Bárbara Bela", onde exaltava a dor da distância da mulher:
"Bárbara
Bela
Do norte estrela
Que o meu destino
Sabe guiar
De ti ausente
Triste somente
As horas passo
A suspirar
Pôr entre as penhas
De incultas brenhas
Cansa-me a vista
De te buscar
Porém não vejo
Mais te desejo,
Sem esperança
De te encontrar |
Eu
também queria
A noite e o dia
Contigo pode passar
Mas orgulhosa
Sorte invejosa,
D’esta fortuna
Me quer privar
Tu, Entre os braços,
Temos abraços
Da filha amada
Pode gozar,
Priva-me da estrela
De ti e D’ela
Busca dou modos
De me matar!".
|
Após a prisão de
Alvarenga Peixoto, Barbara Eliodora não mais escreveu, teve a metade
dos seus bens confiscados e passou a ser discriminada por toda a
sociedade da época. Viúva, passou a se dedicar à educação dos
quatro filhos e à administração dos bens restantes. Em 1795 ela
sofreu outra perda, Maria Ifigênia, em decorrência de uma queda
de cavalo. Figura de expressão na Inconfidência Mineira, Bárbara
foi muito tempo retratada, em livros de história inclusive como demente
louca, como que andava esfarrapada pela Ruas de São João Del Rei
falando Bobagens e loucuras. Neste século alguns escritores como
Aureliano Leite, lutaram para resgatar a verdade de sua vida. Em "A
Vida Heróica de Bárbara Eliodora" Leite afirmava que Bárbara
viveu seus últimos vinte e tantos anos em perfeito juízo, nesse período
cuidou dos negócios da família, foi admitida da ordem 3a. do Carmo, de
São João Del Rei e morreu em São Gonçalo do Sapucaí, aos 60 anos,
vitima de tuberculose: "A uma louca e indigente não se dedicaram
exéquias dessa pompa". Para Aureliano Leite, Houve uma criação
em torno da figura de Eliodora. Lendas que escondem dos brasileiros a
verdade e que são desmentidas em palavras como a do escritor Uruguaio
Rodrigues Fabregat (ver baixo), que qualifica Bárbara Eliodora de
Mulher do Novo Mundo, colocando-a entre as mães da epopéia do Novo
Mundo:
"…e esta outra,
também de sua carne vem, grande e profética: que traz em seus lábios
de Mulher, gladiadora ardente, clamores de despertar; que traz em suas mãos
uma bandeira nova e alça sobre multidões estremecidas; que traz em sua
mensagem um desejo de liberdade, um credo republicano que, com ele sobe
até a cúpula de seu calvário e da história: que junto às minas de
ouro das rapinas imperiais, fala com voz de brasileira, gente a
proclamar direitos e conquistá-los; esta, de Vila Rica, em Minas Gerais
companheira da inconfidência revolucionaria na saga heróica de VGRT e
na morte mártir, esta mulher do novo mundo - oh, mãe epopéia do Novo
Mundo!- cravada em seu madeiro de sacrifício com quatro escravos
ardentes de Cruzeiro do Sul… Bárbara Eliodora !"
Ousada para sua época, Bárbara
foi a primeira Mulher poeta do Brasil, umas das ideologias organizadoras
da inconfidência Mineira, teve uma filha antes do casamento e, mesmo
depois de casada, fez questão de continuar com seu nome de solteira. Após
a morte do marido, Bárbara ainda administrou os negócios
da família, e cuidou da educação dos seus 4 filhos. O texto de
Rodrigues chama de "Mulher do Novo Mundo".
Conselhos a seus
filhos
Meninos, eu vou dictar
As regras do bem viver,
Não basta somente ler,
É preciso ponderar,
Que a lição não faz saber,
Quem faz sabios é o pensar.
Neste tormentoso mar
D'ondas de contradicções,
Ninguem soletre feições,
Que sempre se ha de enganar;
De caras a corações
A muitas legoas que andar.
Applicai ao conversar
Todos os cinco sentidos,
Que as paredes têm ouvidos,
E também podem fallar:
Ha bixinhos escondidos,
Que só vivem de escutar.
Quem quer males evitar
Evite-lhe a occasião,
Que os males por si virão,
Sem ninguem os procurar;
E antes que ronque o trovão,
Manda a prudencia ferrar.
Não vos deixeis enganar
Por amigos, nem amigas;
Rapazes e raparigas
Não sabem mais, que asnear;
As conversas, e as intrigas
Servem de precipitar.
Sempre vos deveis guiar
Pelos antigos conselhos,
Que dizem, que ratos velhos
Não ha modo de os caçar:
Não batam ferros vermelhos,
Deixem um pouco esfriar.
Se é tempo de professar
De taful o quarto voto,
Procurai capote roto
Pé de banco de um brilhar,
Que seja sabio piloto
Nas regras de calcular.
Se vos mandarem chamar
Pâra ver uma funcção,
Respondei sempre que não,
Que tendes em que cuidar:
Assim se entende o rifão.
Quem está bem, deixa-se estar.
Devei-vos acautelar
Em jogos de paro e tópo,
Promptos em passar o copo
Nas angolinas do azar:
Taes as fábulas de Esopo,
Que vós deveis estudar.
Quem fala, escreve no ar,
Sem pôr virgulas nem pontos,
E póde quem conta os contos,
Mil pontos accrescentar;
Fica um rebanho de tontos
Sem nenhum adivinhar.
Com Deus e o rei não brincar,
É servir e obedecer,
Amar por muito temer
Mâs temer por muito amar,
Santo temor de offender
A quem se deve adorar!
Até aqui pode bastar,
Mais havia que dizer;
Mâs eu tenho que fazer,
Não me posso demorar,
E quem sabe discorrer
Póde o resto adivinhar.
Bárbara Heliodora
O sonho
Oh que sonho! Oh! que
sonho eu tive n'esta,
Feliz, ditosa e socegada sésta!
Eu vi o Pão de Assucar levantar-se
E no meio das ondas transformar-se
Na figura de um indio o mais gentil,
Representando só todo o Brazil.
Pendente ao tiracol de branco arminho
Concavo dente de animal marinho
As preciosas armas lhe guardava;
Era thesoiro e juntamente aljava.
De pontas de diamante eram as setas,
As hásteas d'oiro, mas as pennas pretas;
Que o indio valeroso altivo e forte
Não manda seta, em que não mande a morte,
Zona de pennas de vistosas côres
Guarnecida de barbaros lavores,
De folhetas e perolas pendentes,
Finos chrystaes, topazios transparentes,
Em recamadas pelles de sahiras,
Rubins, e diamantes e saphiras,
Em campo de esmeralda escurecia
A linda estrella, que nos traz o dia.
No cocar... oh que assombro! oh que riqueza!
Vi tudo quanto póde a natureza.
No peito em grandes letras de diamante
O nome da augustissima imperante.
De inteiriço coral novo instrumento
As mãos lhe occupa, em quanto ao doce accento
Das saudosas palhetas, que afinava,
Pindaro americano assim cantava.
Sou vassallo e sou leal,
Como tal,
Fiel constante,
Sirvo á glória da imperante,
Sirvo á grandeza real.
Aos elysios descerei
Fiel sempre a Portugal,
Ao famoso vice-rei,
Ao illustre general,
Ás bandeiras, que jurei,
Insultando o fado e a sorte,
E a fortuna desigual,
Qu'a quem morrer sabe, a morte
Nem é morte, nem é mal.
Bárbara Heliodora
Poesias do livro:
"Florilégio da Poesia Brasileira", de Varnhagen, 1946 (nos três tomos
constam "fac-símile do frontespício da ed. princeps do "Florilégio da
Poesia Brasileira", de 1850).
Barão em Foco-
Coletânea História do Brasil